A palavra algoritmo tem sido pauta na maioria das discussões relacionadas à tecnologia, especialmente no que diz respeito a interferência dos algoritmos na escolha de quais conteúdos consumir online e quais são as problemáticas dessa interferência. Mas afinal o que é algoritmo? Algoritmo, dentre alguns significados, pode ser definido como um procedimento computacional baseado em dados que dão um resultado inequívoco. Embora o termo seja frequentemente associado a tecnologia, o conceito, que também pode ser interpretado também como uma curadoria, é bem mais presente em discussões que vão além do debate cibernético. A setlist de um DJ, livros organizados por ordem alfabética em uma biblioteca e até mesmo instruções para uma receita de bolo são curadorias.
E foi justamente o algoritmo, baseado nas escolhas que faço ao engajar alguns conteúdos em detrimento de outros, que “me mostrou” a história de Zuzu Angel, uma importante estilista brasileira que usou a moda como posicionamento durante a ditadura militar.Foto: Wikipedia
Zuleika de Souza Netto, conhecida como Zuzu Angel, natural de Minas Gerais, foi uma importante estilista brasileira. Com influências baianas e mineiras, como as rendas, sedas e chitas, e o uso de estampas coloridas que representassem a fauna e flora nacional. Zuzu ganhou reconhecimento internacional, sobretudo das americanas, com seus vestidos nas décadas de 60 e 70. A figura do Anjo, seu nome artístico, era uma de suas marcas, mas foi em 1971 que tudo mudou.
Em 1971, Stuart Jones, filho de Zuzu foi preso era filiado ao Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8) foi preso, torturado e morto, dado como desaparecido pelo regime militar e isso impactou profundamente a estilista, que passou a buscar por respostas, sendo a dor pela perda do filho combustível para reformulação de seus designs.
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Coleção International Dateline (1971) Foto: Instituto Casa Zuzu Angel |
A coleção chamada como International Dateline Collection III foi seu maior ato de crítica ao desaparecimento de jovens durante a ditadura militar. O desfile foi realizado na embaixada brasileira em Nova York durante os anos de chumbo do governo Médici, nesse período não era permitido fazer propaganda com críticas direcionadas ao regime ditatorial em território internacional, ironicamente ela não violou o decreto.
Os elementos que faziam parte de sua assinatura como pássaros e flores foram substituídos por tanques de guerra, soldados e sóis encarcerados, em bordados como em desenhos infantis. O anjo, tão famoso por estampar bolsas e vestidos, foi representado amordaçado e ferido. Responsável por levar elementos nacionais para a moda internacional, como o cangaço, agora Zuzu Angel denunciava o horror da ditadura militar e continuaria buscando por respostas até o fim de sua vida.
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Foto: Instituto Casa Zuzu Angel |
Em 14 de abril de 1976, Zuzu Angel sofreu um atentado que culminou em sua morte num acidente de carro, que capotou e caiu de uma altura de 10 metros na saída do antigo Túnel Dois Irmãos, que hoje leva seu nome, no Rio de Janeiro. Antes havia avisado alguns amigos, em cartas, um deles Chico Buarque, caso desaparece: "Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho."
Zuzu Angel foi revolucionária, seja levando elementos importantes da cultura brasileira para o mercado de moda internacional, como seus vestidos inspirados no cangaço ou denunciando o desaparecimentos de jovens durante a ditadura. Foi essa coragem que lhe custou a vida, contrária a curadoria nociva do regime militar. Que seu legado não seja esquecido.
Por: George Magela